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Síndrome do comer noturno: o que é e dicas para lidar com o problema

Muitas pessoas se pegam comendo mais do que o comum de noite —ou de madrugada—, mesmo quando não estão com fome. Esse hábito pode fazer com que você ingira mais calorias do que o necessário e levar ao ganho de peso, com consequente desenvolvimento de sobrepeso e obesidade.

A síndrome do comer noturno (SCN) é atribuída a um retardo no ritmo circadiano da alimentação, caracterizado pela supressão do apetite durante as horas da manhã e aumento do apetite durante à noite, sendo que, dessa forma, o comportamento alimentar do indivíduo fica descontrolado no período noturno.

Vários estudos sugerem que aqueles que lutam com os hábitos alimentares noturnos tendem a ficar ansiosos ou agitados à noite. A pessoa fica com mais fome à noite porque seus hormônios de “fome” aumentam à noite. Dessa forma, comer à noite o indivíduo com o transtorno a se sentir mais calmo, talvez até mesmo o “entorpece” e o ajuda a sentir sono o suficiente para tentar adormecer.

Apesar de a causa não estar totalmente esclarecida, trata-se de um distúrbio caracterizado pelo retardo no ritmo circadiano de ingestão alimentar e função neuroendócrino. Em comedores noturnos, ocorrem alterações características neuroendócrinas complexas, além de atenuação nas secreções noturnas de melatonina (hormônio do sono) e leptina (hormônio que regula o apetite) e aumento da secreção circadiana de cortisol (hormônio do estresse).

Os comedores noturnos apresentam grande variabilidade na frequência dos sintomas: podem ter períodos em que experimentam muitos episódios de despertar e comer, mas também períodos em que esses eventos são mínimos.

Pesquisadores também descobriram uma possível ligação entre a síndrome do comer noturno e a genética. Acredita-se que exista um gene chamado PER1 que tem uma função no controle do relógio biológico. Os cientistas acreditam que um defeito no gene pode causar a SCN, mas mais pesquisas são necessárias.

Como identificar

Dentre os critérios de diagnósticos o indivíduo deve ter necessariamente a hiperfagia noturna, isto é, aumento do consumo de pelo menos 25% —podendo chegar até a 50%— da ingestão diária ao comer à noite (depois das 19h) — e/ou acordar à noite para comer —com consciência do ato— duas ou mais vezes por semana. Além disso, deve apresentar pelo menos três das cinco seguintes características:

– Anorexia matinal –definida como ausência de apetite matinal, em que o indivíduo “pula” o café da manhã ou não come pelo menos até as 12:00 em quatro ou mais manhãs por semana;

– Forte necessidade de comer entre o jantar e o início do sono e/ou durante o despertar noturno;

– Insônia, definida como dificuldade de dormir ou permanecer dormindo, pelo menos quatro a cinco vezes por semana.

– Crença de que comer é necessário para iniciar ou voltar a dormir.

– Humor deprimido ou ansiedade que piora durante a noite, deixando a pessoa mais agitada, irritada ou deprimida.

É importante ressaltar que existe no indivíduo a consciência e a capacidade de recordar das ingestões noturnas, pois esse ponto difere a síndrome do comer noturno do transtorno alimentar relacionado ao sono, em que as ingestões noturnas ocorrem sem consciência e são incapazes de serem lembradas. A série de sintomas associados à SCN torna a síndrome mais bem conceituada como uma combinação de alimentação, sono, humor e características de transtorno de estresse.

Relatos de caso e estudos abertos sugeriram benefício de uma variedade de estratégias para o tratamento da SCN, incluindo tratamento farmacológico, terapia cognitivo-comportamental (TCC) e várias outras alternativas, como relaxamento muscular progressivo, fototerapia e terapia comportamental.

Algumas dicas para lidar com o problema

– Identifique a causa A alimentação noturna pode ser o resultado de uma ingestão excessivamente restrita de alimentos durante o dia, gerando fome voraz à noite, ou causada por hábito ou tédio. No entanto, a alimentação noturna excessiva pode estar associada a transtornos alimentares, incluindo transtorno da compulsão alimentar periódica e síndrome do comer noturno (SCN) —este último, o tema do texto. Esses transtornos são caracterizados por padrões e comportamentos alimentares diferentes, entretanto podem ter os mesmos efeitos negativos na sua saúde. Em ambos, as pessoas usam a comida para conter emoções como tristeza, raiva, ansiedade ou frustração, e muitas vezes comem mesmo quando não estão com fome; comendo em grande quantidade e alimentos calóricos. Ambas as condições têm sido associadas à obesidade, depressão e problemas para dormir. Identificada a causa, é mais fácil buscar ajuda para controlar os sintomas.

– Preste atenção nos gatilhos Procure um padrão específico de eventos que geralmente desencadeiam seu comportamento alimentar. As pessoas buscam comer por vários motivos. Se você não está com fome e mesmo assim se pega comendo à noite, pense no que o levou a isso. Com a síndrome da alimentação noturna, todo o seu padrão alimentar pode ser atrasado devido à falta de fome diurna. Uma maneira eficaz de identificar a causa de sua alimentação noturna e as coisas que a desencadeiam é manter um diário de “alimentação e humor”, isto é, tomar nota se está com fome por conta de alguma condição emocional. Acompanhar seus hábitos alimentares e de exercícios juntamente com seus sentimentos ajudará você a identificar padrões, permitindo que trabalhe para quebrar quaisquer ciclos negativos de comportamento.

– Estabeleça uma rotina Se você está comendo demais porque não está comendo o suficiente durante o dia, estabelecer uma rotina pode ajudar, pois horários estruturados de comer e dormir irão auxiliar a distribuir sua ingestão de alimentos ao longo do dia para que você sinta menos fome à noite. Dormir bem é muito importante quando se trata de controlar a ingestão de alimentos e o peso, pois a falta de sono e a curta duração do sono têm sido associadas a maior ingestão de calorias e dietas de baixa qualidade. Por um longo período de tempo, dormir mal pode aumentar o risco de obesidade e doenças relacionadas.

– – Planeje suas refeições Organizar suas refeições e comer lanches saudáveis pode reduzir o risco de você comer por impulso e fazer escolhas alimentares inadequadas. Ter um plano alimentar também pode reduzir qualquer ansiedade sobre o quanto você está comendo e ajudar você a distribuir a comida ao longo do dia, mantendo a fome sob controle.

– Fuja do estresse Ansiedade e estresse são duas das razões mais comuns pelas quais as pessoas comem quando não estão com fome. No entanto, usar comida para conter suas emoções é uma má ideia. Se você notar que come quando está ansioso ou estressado, tente encontrar outra maneira de se livrar das emoções negativas e relaxar. Uma pesquisa mostrou que as técnicas de relaxamento —como exercícios respiratórios, meditação, ioga, alongamentos ou até caminhada— podem ajudar a controlar transtornos alimentares.

– Fracione a alimentação ao longo do dia Comer em excesso à noite tem sido associado a padrões alimentares equivocados que muitas vezes podem ser categorizados como alimentação desordenada. Comer em intervalos planejados ao longo do dia, de acordo com os padrões alimentares “normais”, pode ajudar a manter o açúcar no sangue estável e prevenir a sensação de fome voraz, cansaço, irritabilidade ou falta de alimento, o que pode levar à compulsão —afinal, quando você fica com muita fome, é mais provável que faça escolhas alimentares ruins e busque junk food com alto teor de gordura e açúcar. Estudos mostram que pessoas com horários regulares de refeição (comendo três ou mais vezes por dia) têm melhor controle do apetite e menor peso. A frequência de alimentação para controlar a fome e a quantidade de comida consumida provavelmente varia entre as pessoas, por isso é preciso encontrar uma rotina que funcione para você.

– Inclua proteínas nas refeições Alimentos diferentes podem ter efeitos diferentes no apetite e incluir proteínas em todas as refeições pode ajudar a controlar sua fome e ajudá-lo a se sentir mais satisfeito ao longo do dia, evitando que você se preocupe com a comida e evite lanches noturnos. Um estudo mostrou que comer refeições frequentes com alto teor de proteína reduz os desejos em 60% ao longo do dia e corta o desejo de comer à noite pela metade.

– Tente não armazenar besteiras e guloseimas em casa Se você costuma consumir besteiras com alto teor de gordura e açúcar à noite, não estoque em casa. Se lanches não saudáveis não estiverem ao seu alcance, é muito menos provável que você os coma. Tenha em casa alimentos saudáveis e in natura que você goste.

– Encontre distrações Se você está preocupado com a comida porque está entediado, encontre outra coisa que goste de fazer à noite, pois isso ajudará a manter sua mente ocupada. Encontrar um novo atrativo ou planejar atividades noturnas pode ajudar a prevenir lanches excessivos tarde da noite.

– Incorpore hábitos de sono Mude para uma rotina que ajuda você a relaxar e descontrair. Isso geralmente inclui estratégias como desligar as telas mais cedo e estabelecer hábitos que indicam sono (ou seja, ler com pouca luz e beber chá descafeinado ou fazer anotações antes de dormir).

– Busque suporte emocional Se você acha que pode ter síndrome da alimentação noturna ou transtorno da compulsão alimentar periódica, procure ajuda profissional, pois um profissional pode ajudá-lo a identificar seus gatilhos e implementar um plano de tratamento. Esses planos costumam usar terapia cognitivo-comportamental (TCC), que já demonstrou ajudar em muitos transtornos alimentares. Criar uma rede de apoio emocional também ajudará você a encontrar maneiras de controlar as emoções negativas que, de outra forma, poderiam levá-lo à geladeira.

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Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do saudevitalidade.com

Por: Paola Machado

Fonte: Paola Machado, é formada em educação física, mestre em ciências da saúde (foco em fisiologia do exercício e imunologia) e doutora em ciências da saúde (foco em fisiopatologia da obesidade e fisiologia da nutrição) pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). Atualmente, atua como pesquisadora, desenvolvendo trabalhos científicos sobre exercícios, nutrição e saúde. CREF: 080213-G | SP

Transcrito: https://www.uol.com.br/vivabem/colunas/paola-machado/2021/01/07/sindrome-do-comer-noturno-o-que-e-e-dicas-gerais.htm

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