O horário de comer tem influência no ganho ou perda de peso
Termogênese induzida pela dieta: médico endocrinologista explica que novas estratégias terapêuticas para emagrecimento e tratamento de doenças metabólicas devem levar em conta não apenas a ingestão calórica, mas também a hora das grandes refeições
A obesidade resulta de uma combinação de fatores genéticos, epigenéticos, fisiológicos, ambientais e socioculturais que levam a um desequilíbrio entre consumo e gasto de energia. Este fato reforça a ideia de que a obesidade é uma doença complexa, que requer uma abordagem multidimensional para compreender e entender todos os mecanismos subjacentes que causam o excesso de adiposidade. As estratégias terapêuticas atuais concentram-se principalmente no desequilíbrio entre gasto energético e ingestão calórica. Estudos recentes estão vinculando o relógio circadiano (período de 24 horas no qual se baseia nosso ciclo biológico) ao nível comportamental, enfatizando que o momento do dia da ingestão de alimentos em si pode desempenhar um papel importante na regulação do peso. Levando em consideração que a alimentação é a fonte de energia para o tecido adiposo, o horário da refeição, particularmente para refeições com alto teor de energia, pode ser decisivo e mudanças nesse tempo podem ter consequências metabólicas para o desenvolvimento da obesidade e talvez para a perda de peso.
Termogênese induzida pela dieta
Comer tem hora certa: um café da manhã extenso deve ser preferido em relação a grandes refeições à noite para prevenir a obesidade e altos picos de glicose — Foto: Internet
Os processos de digestão, absorção e utilização dos nutrientes requerem que o organismo gaste certa quantidade de energia. Quando há a ingestão de alimentos, a produção de calor pelo corpo aumenta para valores acima dos níveis basais. Essa energia gasta é chamada de Termogênese Induzida pela Dieta, representando cerca de 10% do gasto energético diário total.
Um estudo recente evidenciou que os participantes da pesquisa tiveram um aumento de termogênese induzida pela dieta duas vezes e meia maior pela manhã do que à noite, após refeições com altas e baixas calorias. A termogênese induzida pela dieta é claramente mais alta pela manhã do que à noite, independentemente da quantidade calórica consumida; um café da manhã extenso deve, portanto, ser preferido em relação a grandes refeições à noite para prevenir a obesidade e altos picos de glicose no sangue, mesmo sob condições de uma dieta hipocalórica.
Um outro estudo conduzido na Espanha mostrou que o momento da ingestão de alimentos está relacionado à eficácia da perda de peso em humanos. Em 420 pacientes com sobrepeso/obesidade submetidos a uma dieta de perda de peso de 20 semanas, aqueles que comeram sua refeição principal mais tarde perderam significativamente menos peso do que os que comiam mais cedo. Essa diferença no sucesso da perda de peso não foi explicada por diferenças na ingestão calórica, distribuição de macronutrientes ou gasto energético.
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Há um número crescente de publicações mostrando o efeito do horário das refeições na obesidade. Como estudos em animais indicando que a reversão do ritmo da alimentação causa efeitos metabólicos adversos e que a correção do momento da ingestão de alimentos pode até impedir distúrbios metabólicos em animais com dieta rica em gordura. Além disso, estudos em humanos com pacientes que não tomam café da manhã também são consistentes com o conceito de que o momento da ingestão de alimentos é um fator determinante no ganho de peso. Foi publicado recentemente que o café da manhã com alto teor de carboidratos e proteínas pode impedir o aumento de peso, possivelmente em parte por mudanças no controle circadiano da fome e do apetite.
O momento da ingestão dos alimentos é de fato crítico para o desenvolvimento de distúrbios metabólicos: estudos com camundongos tem evidenciado que estes distúrbios coincidem com o aumento da exposição à luz durante a noite e no turno de trabalho; o relógio biológico endógeno segue eventos previsíveis para a homeostase energética e a sua interrupção causa distúrbios circadianos e metabólicos.
Os achados atuais podem ajudar no desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas incorporando não apenas a ingestão calórica e a distribuição de macronutrientes – como é feito de maneira clássica – mas também o horário das grandes refeições. Lembrando da importância em individualizar cada caso: por isso é fundamental o acompanhamento médico e nutricional.
Referências bibliográficas:
1.Fonken LK, Workman JL, Walton JC, Weil ZM, Morris JS, Haim A, et al. Light at night increases body mass by shifting the time of food intake. Proc Natl Acad Sci U S A. 2010;107(43):18664–9.
2.Garaulet, M., Gómez-Abellán, P., Alburquerque-Béjar, J. J., Lee, Y. C., Ordovás, J. M., & Scheer, F. A. (2013). Timing of food intake predicts weight loss effectiveness. International journal of obesity (2005), 37(4), 604–611. https://doi.org/10.1038/ijo.2012.229.
3.Juliane Richter, Nina Herzog, Simon Janka, Thalke Baumann, Alina Kistenmacher, Kerstin M Oltmanns, Twice as High Diet-Induced Thermogenesis After Breakfast vs Dinner On High-Calorie as Well as Low-Calorie Meals, The Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism, Volume 105, Issue 3, March 2020, Pages e211–e221, https://doi.org/10.1210/clinem/dgz311.
4.Morris, Christopher J et al. “The Human Circadian System Has a Dominating Role in Causing the Morning/Evening Difference in Diet-Induced Thermogenesis.” Obesity (Silver Spring, Md.) vol. 23,10 (2015): 2053-8. doi:10.1002/oby.21189.
Por: Guilherme Renke
Fonte: Guilherme Renke, Médico endocrinologista da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia e Médico do Esporte Titular da Sociedade Brasileira de Medicina do Esporte
Transcrito: https://globoesporte.globo.com/eu-atleta/nutricao/post/2020/07/16/o-horario-de-comer-tem-influencia-no-ganho-ou-perda-de-peso.ghtml