Jejum ou dieta de restrição de calorias? O que é melhor?
Médico endocrinologista Guilherme Renke explica novo estudo britânico que vê vantagem em planos tradicionais com redução calórica quando o objetivo é emagrecer. Entenda
Nas últimas décadas, a obesidade e o excesso de peso tornaram-se um dos principais problemas de saúde pública, considerando seu constante aumento da prevalência nos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Por isso, nos últimos anos, o jejum tornou-se cada vez mais famoso como estratégia para a perda de peso e melhora dos parâmetros metabólicos, sendo muitas vezes prescrito por profissionais da saúde ou até mesmo realizado sem orientação profissional por pessoas leigas. As dietas que levam as pessoas a jejuar alguns dias por semana aumentaram de popularidade, reforçadas por imagens das transformações milagrosas de peso das pessoas e apoiadas pelo endosso de celebridades.
Na dúvida entre fazer jejum intermitente ou dieta mais tradicional? O mais importante para a perda de gordura corporal é gerar déficit calórico — Foto: Internet
Apesar do jejum intermitente ser cada vez mais popular, não se sabe se ele em si oferece benefícios nutricionais específicos para indivíduos magros e saudáveis em comparação com a restrição calórica diária, isto é, a tradicional dieta de contagem de calorias.
Mas afinal, o que é jejum?
O jejum é definido como a abstinência voluntária de alguns ou todos os alimentos e bebidas por razões terapêuticas, espirituais ou políticas. Recentemente, pesquisas em modelos animais e humanos buscam descobrir as potenciais respostas fisiológicas promotoras da saúde ao jejum, incluindo modulação hormonal, redução do estresse oxidativo e da inflamação e aumento da resistência ao estresse, da lipólise e da autofagia.
Existem diversos métodos de jejum e os mais comuns são:
– O método 16/8, o qual envolve jejuns diários de cerca de 16 horas;
– A dieta 5:2, quando você come normalmente em cinco dias da semana e restringe sua ingestão calórica durante dois dias da semana;
– O jejum de 24 horas uma ou duas vezes por semana.
O que um novo estudo diz sobre o jejum?
Uma nova pesquisa publicada neste mês de junho na revista Science Translational Medicine, realizada por uma equipe de fisiologistas da Universidade de Bath, na Inglaterra, desafia a crença popular de que dietas de jejum intermitente são as maneiras mais eficazes para perder peso. O estudo foi feito com 36 participantes saudáveis e magros, os quais foram distribuídos em grupos:
– Grupo 1: jejuou em dias alternados, com o dia de jejum seguido por um dia comendo 50% a mais do que o normal;
– Grupo 2: reduziu as calorias em todas as refeições diárias em 25%, realizando a dieta tradicional de restrição de calorias diárias sem jejum;
– Grupo 3: jejuou em dias alternados (da mesma forma que o Grupo 1), mas seguiu seu dia de jejum com um dia comendo 100% a mais do que o normal.
O melhor resultado foi do grupo que realizou a dieta tradicional de restrição de calorias diárias sem jejum (Grupo 2), o qual perdeu em média 1,9 kg em apenas três semanas, e as varreduras corporais de DEXA (exame “padrão ouro” para avaliação da composição corporal) revelaram que essa perda de peso foi quase inteiramente devida a uma redução no conteúdo de gordura corporal, e não muscular.
Resultado diferente do grupo 1, o qual jejuou em dias alternados e também perdeu peso, em média 1,6 kg; no entanto, apenas metade dessa perda de peso foi devido à redução da gordura corporal e o restante foi devido à massa muscular, sendo um resultado não promissor quanto à perda de peso.
As descobertas do experimento sugerem que não há nada de especial no jejum quando comparado às dietas padrão mais tradicionais que geram déficit calórico. Em resumo, para adultos magros e saudáveis, a restrição energética diária contínua (dieta tradicional com déficit calórico) resulta em perda significativa de peso que é quase inteiramente atribuível à redução da massa de tecido adiposo, ou seja, gordura.
Em contraste, o uso do jejum em dias alternados para provocar o mesmo déficit de energia reduz de forma menos eficaz a massa gorda, certamente atribuível também pela redução dos níveis de atividade física nos dias de jejum, segundo os autores do estudo.
Outras revisões recentes de testes em humanos indicam que o jejum intermitente pode provocar perda de peso e ganhos de saúde, mas que esses efeitos são geralmente equivalentes à restrição energética padrão sem tempos de alimentação restritos (ou seja, sem jejum), indicando que os efeitos metabólicos podem ser devido à perda de peso, em vez de ao jejum em si.
As evidências até o momento sobre a eficácia do jejum em comparação com dietas mais tradicionais, que visam reduzir a ingestão de calorias ao longo de uma semana inteira, são limitadas.
Percebe-se que o mais importante para a perda de gordura corporal é gerar déficit calórico, ou seja, gastar mais energia e ingerir menos calorias. Para ser uma perda de peso atribuível à perda de gordura e não de massa muscular, é importante a orientação multiprofissional, como nutricionistas e profissionais de educação física, a fim de individualizar cada caso e alcançar e manter uma ótima composição corporal.
Referências:
1. Templeman, I., Smith, H. A., Chowdhury, E., Chen, Y. C., Carroll, H., Johnson-Bonson, D., … & Betts, J. A. (2021). A randomized controlled trial to isolate the effects of fasting and energy restriction on weight loss and metabolic health in lean adults. Science Translational Medicine, 13(598).
2. Rynders, C. A., Thomas, E. A., Zaman, A., Pan, Z., Catenacci, V. A., & Melanson, E. L. (2019). Effectiveness of Intermittent Fasting and Time-Restricted Feeding Compared to Continuous Energy Restriction for Weight Loss. Nutrients, 11(10), 2442.
Por: Guilherme Renke
Fonte: Guilherme Renke, Médico endocrinologista da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia e Médico do Esporte Titular da Sociedade Brasileira de Medicina do Esporte
Transcrito: https://ge.globo.com/eu-atleta/saude/post/2021/06/24/jejum-ou-restricao-calorica-o-que-e-melhor-para-emagrecer.ghtml