Estudo: presença de parceiro reduz a velocidade da caminhada
Caminhar sozinho ou acompanhado? Fisiologista do exercício e psicóloga esportiva avaliam o impacto de ter uma companhia na saúde e motivação para seguir na atividade de forma regular
Um estudo americano publicado em março indica que caminhar com um parceiro reduz a velocidade da caminhada daquele que tem o ritmo mais rápido, em vez de aumentar a velocidade do mais lento. Mas, afinal, no que isso implica? Buscando avaliar se a diminuição do ritmo para acompanhar alguém reduz também os ganhos da caminhada para a saúde e entender o ato de caminhar com o parceiro como um fator de motivação, o Eu Atleta conversou com o fisiologista do exercício Yago Medeiros e com a psicóloga esportiva Gabriela Corrêa. Mas, antes de tudo, é importante salientar que, seja sozinho ou acompanhado, a prática de exercício físico deve ser sempre incentivada.
O estudo
Caminhar com o parceiro pode reduzir a velocidade da marcha do mais rápido — Foto: Internet
De maneira geral, o principal objetivo do estudo foi avaliar a velocidade da caminhada de 72 casais (25 a 79 anos) em vários ambientes e em três condições diferentes: andando de “mãos dadas” com o parceiro, andando ao lado do parceiro e andando sem a companhia do parceiro. Os achados da pesquisa demonstram que os participantes andaram mais rápido quando estavam andando sozinhos e que a velocidade da caminhada diminuiu quando a mesma foi realizada com o parceiro, sendo ainda mais lenta quando realizada de “mãos dadas”.
Resultados:
– Os adultos mais velhos diminuíram mais a velocidade da marcha do que os adultos jovens quando o caminho estava com obstáculos;
– Um ambiente mais desafiador revelou adaptações relacionadas à idade;
– Ao longo da vida adulta, ambos os parceiros andavam mais devagar quando caminhavam juntos;
– A velocidade reduzida ao caminhar juntos pode afetar os benefícios para a saúde e a qualidade da marcha.
Prós e contras
Afinal, reduzir o ritmo da marcha para acompanhar alguém reduz também os ganhos da caminhada para a saúde? E aumentar o ritmo? Caminhada e romantismo ou companheirismo seriam então incompatíveis? De acordo com o fisiologista do exercício Yago Medeiros, para julgar se algo é bom ou ruim no contexto de “atividade física e saúde”, faz-se necessário relembrar o que é saúde.
Segundo a clássica definição, saúde é um estado de bem-estar composto por três pilares: físico, mental e social. A prática de atividade física regular é seguramente uma estratégia eficaz para promover ganhos nesses três aspectos e, consequentemente, trazer benefícios à saúde. Nesse contexto, reduzir a velocidade da caminhada para acompanhar alguém pode, sim, gerar uma pequena diminuição nos benefícios que essa atividade física desencadeia sobre o aspecto físico. Mas os benefícios da caminhada em relação à saúde ainda existem, e são somados aos ganhos pelo lado mental e social.
– Ao caminhar em uma velocidade mais lenta do que gostaria/precisaria, o indivíduo provavelmente estará reduzindo o nível de “estresse fisiológico” gerado por essa atividade física, reduzindo, assim, os ganhos físicos induzidos por ela (ex.: melhora da aptidão cardiorrespiratória, redução dos níveis glicêmicos, redução dos níveis de colesterol sanguíneo, dentre outros). No entanto, a diminuição da velocidade da caminhada pode ser o “preço a se pagar” para que a prática de atividade física se torne algo mais prazeroso e consequentemente regular, impactando diretamente nos outros dois pilares que constituem um estado saudável. No contexto de “atividade física e saúde”, várias questões devem ser ponderadas para julgar se algo é benéfico ou prejudicial, porém, uma certeza absoluta é: caminhar, independente da velocidade, é melhor do que não fazer nada – aponta Yago.
Além disso, entrar em uma vida fisicamente ativa é bem complexo, principalmente para aqueles que não veem a menor graça em “calçar o tênis e sair andando por aí”. Segundo o fisiologista, isso exige mudanças comportamentais, na forma de ver e de julgar determinadas situações. Nesse contexto, estudos conduzidos com pessoas de diferentes idades e com diferentes condições de saúde (diabéticos, hipertensos, obesos) apontam que uma estratégia eficiente para iniciar e/ou aumentar o engajamento de indivíduos em um programa regular de atividades físicas é a realização das mesmas junto a um parceiro. Esse “empurrãozinho” para a prática de atividade física é cientificamente chamado de “suporte social” e sua eficácia em auxiliar mudanças comportamentais já foi demonstrada em diferentes situações, inclusive, no contexto da prática de atividade física.
Dessa forma, é possível dizer que caminhar com o parceiro é um fator de motivação. De acordo com a psicóloga esportiva Gabriela Corrêa, a caminhada é uma atividade física acessível a todos os públicos e pode contribuir para a melhora da saúde física e mental. Os motivos que levam as pessoas a iniciarem e seguirem praticando são múltiplos e diversos, sendo a sociabilidade um importante fator motivador que deve ser considerado e está relacionado a benefícios sociais (amizade, companheirismo, sensação de pertencimento) que se somam aos físicos e mentais para quem pratica.
– Para falar sobre o resultado obtido no estudo (o parceiro mais rápido segue o ritmo do mais lento) é necessário investigar os benefícios buscados por cada um com a atividade física. Por também envolver fatores sociais, quando se escolhe se exercitar acompanhado, a importância da interação social para a pessoa deve ser considerada. Dessa forma, se o foco da prática estiver ancorado em valores sociais e não em rendimento, por exemplo, o objetivo foi atingido e a pessoa se sentirá recompensada – indica a profissional.
Ainda segundo Gabriela, mudar e/ou adquirir algum hábito requer um esforço individual. O suporte de parceiros pode ser muito positivo quando a pessoa consegue identificar suas necessidades pessoais e comunicar de forma clara, em pedido de apoio. Por isso, acolher, respeitar, compreender e valorizar o esforço de quem está empenhado em melhorar hábitos que afetam diretamente sua saúde é uma opção bastante eficaz.
Benefícios da caminhada
A caminhada é um exercício acessível a todos os públicos, sendo um ótimo caminho para se ter uma vida mais ativa — Foto: Internet
De acordo com Yago Medeiros, caminhar em qualquer ritmo, desde que de forma regular, é capaz de promover inúmeros benefícios tais quais:
1. Redução dos níveis glicêmicos;
2. Redução dos níveis de colesterol sanguíneo;
3. Auxílio no processo de emagrecimento;
4. Melhora de quadros de ansiedade e depressão;
5. Redução dos riscos de morte prematura em decorrência de doenças crônico-degenerativas como hipertensão, diabetes e câncer.
– No entanto, os ganhos induzidos por qualquer atividade física são dependentes de alguns fatores, como características do praticante, intensidade, duração e frequência de realização. A prática da caminhada, geralmente, é a porta de entrada para uma vida fisicamente ativa e, por isso, deve ser encorajada. Porém, é importante ressaltar que buscar um acompanhamento profissional é algo que certamente irá reduzir os riscos e potencializar os ganhos que a prática da caminhada oferece à saúde – explica o fisiologista do exercício.
Vale destacar que os benefícios da caminhada para a saúde física são os mesmos sendo ela praticada em companhia ou de forma solitária, desde que sejam seguidas as orientações profissionais para alcançar o objetivo pretendido. Gabriela aponta que ter companhia pode ser uma maneira de desenvolver e fortalecer aspectos psicológicos, tais como a satisfação pela presença de alguém querido, sensação de aceitação e pertencimento e elevação da autoestima e da segurança.
– De maneira geral, o estudo é interessante e bem realizado, porém, é preciso ter cautela ao interpretar os resultados e tirar conclusões sobre os mesmos. O fato de reduzir a velocidade da caminhada ao realizá-la com um parceiro pode, à primeira vista, parecer algo ruim, mas, olhando de uma forma mais global, julgo que poder ser um pequeno “prejuízo” em meio a potenciais grandes benefícios, principalmente em populações especiais como idosos e portadores de comorbidades. A prática regular de atividade física tende a ser reduzida nesse tipo de população e, ao meu ver, quaisquer estratégias para reverter esse quadro, como a prática junto a um parceiro, devem ser vistas com bons olhos. Mantê-la (a caminhada) obviamente traz inúmeros benefícios à saúde – conclui Yago.
Por: Marina Borges, para o Eu Atleta — Bauru, São Paulo
Fonte: Yago Medeiros, fisiologista do exercício
Gabriela Corrêa, psicóloga esportiva
Transcrito: https://globoesporte.globo.com/eu-atleta/treinos/noticia/estudo-presenca-um-parceiro-reduz-a-velocidade-da-caminhada.ghtml