Coração da mulher atleta é mais protegido do que o do homem
Estudos demonstram que mulheres têm menos risco de morte súbita ligada ao exercício do que homens: médico cardiologista Mateus Feitas Teixeira explica
O número de atletas do sexo feminino que participam de esporte de elite e amador é cada vez maior. Em contraste com atletas do sexo masculino, poucos estudos se concentraram nas adaptações cardiovasculares ao exercício em mulheres, nos efeitos do exercício ao longo da vida no músculo cardíaco e no tecido elétrico, no risco de morte cardíaca súbita relacionada ao exercício e no manejo de doenças cardiovasculares. Mas uma revisão de estudos sobre o coração da mulher atleta publicada na revista European Cardiology Review em 2021 nos apresenta uma boa visão sobre o tema.
Houve um aumento significativo no número de atletas do sexo feminino competindo nas Olimpíadas e nos mais altos escalões dos esportes, mas as mulheres continuam sendo pouco estudadas. É vital reconhecer o impacto do exercício intensivo no coração da atleta feminina. Afinal, o exercício intensivo regular está associado a várias manifestações estruturais elétricas e cardíacas, alterações fisiológicas, conhecidas como coração do atleta. Isso leva a um maior volume sistólico para gerar e entregar um débito cardíaco aumentado por períodos prolongados; ou seja, leva a um crescimento dos ventrículos, gerando maior fluxo sanguíneo produzido a cada batimento cardíaco. São alterações cardíacas fisiológicas para aumento de performance.
Há doenças cardíacas que o esporte gera no homem, mas não gera na mulher, já que a mulher não tem uma propensão à fibrilação atrial gerada pelo excesso de exercício — Foto: Istock Getty Images
A variação cromossômica entre homens e mulheres resulta em diversas diferenças, incluindo variações fisiológicas, psicológicas e bioquímicas, que influenciarão sua adaptação cardiovascular ao exercício. As mulheres são geralmente menores, com uma massa corporal magra mais baixa e, na área hormonal, com estrogênios circulantes mais altos e níveis mais baixos de andrógenos para produzir a força e o impulso para os esportes. Com isso, algumas conclusões que estudos tiveram até agora são:
– Os homens atletas têm alterações muito diferentes no eletrocardiograma e no ecocardiograma;
– Há doenças cardíacas que o esporte gera no homem, mas não gera na mulher, já que a mulher não tem uma propensão à fibrilação atrial gerada pelo excesso de exercício. Ela teria uma proteção a mais;
– O risco de morte súbita cardíaca relacionada ao exercício é significativamente menor em mulheres do que em homens;
– As mulheres que praticaram exercícios ao longo da vida não apresentam maior prevalência de fibrilação atrial, calcificação da artéria coronária ou fibrose miocárdica do que suas contrapartes sedentárias.
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Estudos
Um estudo realizado em atletas do sexo feminino comparou 600 mulheres com 66 controles sedentários. As mulheres deste estudo eram brancas, relativamente jovens, com idade média de 21 anos, histórico de exercícios de mais de 9 anos e participavam de 27 disciplinas esportivas, incluindo natação, patinação, pista eventos e ginástica. A pesquisa descobriu que, em comparação com os controles, as atletas do sexo feminino tinham uma parede do ventrículo esquerdo (VE) mais espessa e um tamanho da cavidade maior. Em comparação com os atletas do sexo masculino, as mulheres apresentaram menores dimensões absolutas da cavidade do VE. Independentemente do sexo, os determinantes do tamanho cardíaco incluem idade, etnia e disciplina esportiva com as maiores dimensões identificadas naqueles que praticam esportes de resistência.
Atletas do sexo feminino geralmente têm dimensões absolutas do ventrículo direito menores do que os atletas do sexo masculino, mas, quando indexado à área de superfície corporal, as atletas do sexo feminino têm maiores dimensões.
Recentemente, os corações de atletas do sexo feminino foram avaliados com a geometria do ventrículo esquerdo, que leva em consideração a massa e a espessura relativa da parede do ventrículo. Um grupo de pesquisadores do grupo acadêmico de cardiologia clínica da University of London estudou a geometria do ventrículo esquerdo em 1.083 atletas adultos jovens, incluindo 443 mulheres competindo em diversos esportes. Eles identificaram que 22% das atletas do sexo feminino apresentaram geometria anormal com maior prevalência de hipertrofia excêntrica do VE naquelas praticantes de esportes de resistência. Em contraste, os atletas do sexo masculino são mais propensos a desenvolver hipertrofia concêntrica.
Nenhuma das mulheres exibiu uma espessura relativa da parede do ventrículo esquerdo, o que sugere que os corações femininos se adaptam aumentando o tamanho da cavidade do VE. Este parâmetro pode ser usado para diferenciar a hipertrofia anormal do ventrículo esquerdo de alterações fisiológicas, em vez de medidas absolutas da espessura da parede da câmara.
Além disso, outro estudo avaliou como as diferenças étnicas afetam as adaptações cardíacas em 400 atletas do sexo feminino. Os autores demonstraram maior espessura da parede e massa do vetrículo esquerdo em mulheres negras em comparação com atletas brancas. Todas as atletas do sexo feminino apresentaram índices normais de função sistólica e diastólica.
O aumento do átrio esquerdo ocorre em correlação com a dilatação do ventrículo esquerdo secundária à alta pré-carga imposta em todas as quatro câmaras com exercício de resistência intensivo.13 Atletas do sexo feminino têm volumes atriais absolutos e indexados maiores em comparação com os controles.
Assim sendo, as mulheres atletas têm uma prevalência menor de grandes alterações em exames como eletrocardiograma e ecocardiograma (complexos QRS, alterações de repolarização, incluindo inversão da onda T inferior e lateral) e dimensões cardíacas que excedem os limites previstos em comparação com os homens.
Ainda existem grandes lacunas em nosso conhecimento em relação a várias doenças cardiovasculares e especificidades no coração feminino, exigindo mais estudos sobre essas variedades, para aumentarmos a compreensão sobre essas condições e evitar falhas diagnósticas.
Por: Mateus Freitas Teixeira
Fonte: Mateus Freitas Teixeira, Cardiologista do Vasco da Gama, é diretor da Sociedade de Medicina do Exercício e do Esporte do Rio de Janeiro e coordenador médico da Clínica Fit Center
Transcrito: https://ge.globo.com/eu-atleta/saude/post/2022/07/06/coracao-da-mulher-atleta-e-mais-protegido-do-que-o-do-homem.ghtml