Agrotóxico mais usado no mundo é apontado como cancerígeno; há perigo?
Resumo da notícia
.Estudo traz à tona polêmica da relação entre câncer e o agrotóxico conhecido como glifosato
.Oncologista explica que ainda não existem evidências suficientes para confirmar a relação
.Agrônoma aponta característas da substância e afirma que, se usado corretamente, o pesticida é seguro
Você pode não conhecer esse nome, mas o glifosato provavelmente esteve presente nas plantações que viraram suas refeições. Trata-se do agrotóxico mais usado no mundo, presente em 90% das plantações de soja e nos principais cultivos agrícolas.
Apesar de amplamente comercializado, o glifosato é apontado por alguns cientistas como cancerígeno e acusado de ser um possível responsável por casos de linfomas não-Hodgkin.
Diferentes empresas usam a substância em suas produções, entra elas, a Monsanto, agora adquirida pela Bayer, que no passado já foi condenada a pagar R$ 1,1 bilhão a um paciente que alegou que seu câncer havia sido causado pelo agrotóxico –no caso dele, um jardineiro, o contato com o agrotóxico se deu por aplicar o produto em plantações.
Há pouco tempo, produtores brasileiros tiveram sua exportação de soja para a Rússia temporariamente interrompida pela alta quantidade de glifosato encontrada no alimento. A Aprosoja Brasil (Associação Brasileira dos Produtores de Soja) afirmou que recebeu com surpresa a notificação russa, já que nas análises periódicas em produtos de origem vegetal realizadas pelo Ministério da Agricultura as amostras de soja estavam 100% dentro dos limites permitidos por lei.
Um relatório da Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC) também classificou a substância como “provável carcinógeno humano” em 2015, e agora, uma nova análise de várias pesquisas científicas, publicada no periódico Science Direct, aumenta a polêmica.
As descobertas dos cinco cientistas norte-americanos contradizem as garantias da EPA (Agência de Proteção Ambiental dos EUA) de segurança sobre o herbicida e mostra, que pessoas com alta exposição (sem especificar quantidade) ao pesticida têm um risco 41% maior de desenvolver câncer do tipo linfoma não-Hodgkin.
No entanto, conforme aponta o oncologista André Murad, professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), outras metanálises concluíram o contrário. “Precisamos de um estudo muito grande, completo e prospectivo para acabar com qualquer dúvida”, explica.
De acordo com Angelo Zanaga Trapé, médico toxicologista e professor doutor aposentado da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), que realizou estudo ainda não publicado em trabalhadores que aplicam a substância no Mato Grosso, “do ponto de vista de toxicologia clínica, não há nenhum tipo de perigo maior caso a exposição seja feita com proteção”
Murad ainda explica que raramente o agrotóxico penetra no interior dos alimentos, o que dificulta a alta exposição de pessoas comuns. “De qualquer modo, recomendamos que antes de consumir alimentos como frutas consumidas com casca, as pessoas devem lavar bem o alimento e deixar de molho por um período para eliminar possíveis resquícios da substância”, afirma.
Possibilidades de contaminação
O perigo aumenta, no entanto, em locais onde não há boa vigilância dos agrotóxicos. “Quando a fiscalização é muito fraca, a população e o meio ambiente sem dúvidas são prejudicados –isso em casos de diferentes agrotóxicos”, aponta Murad. “É especialmente preocupante quando a pulverização é área e os produtos são jogados de avião sem os devidos cuidados previstos nas legislações. Isso acaba atingindo, além das plantações, rios e pessoas”, completa.
De acordo com Pedro Cristofoleti, agrônomo e professor da USP (Universidade de São Paulo) — ESALQ (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), o glifosato é um produto quase imóvel no ambiente, um benefício que evita a contaminação.
“Quando entra em contato com organismos não alvos, sua caraterística biológica faz com que ele não se movimente no solo e tenha pouca ação fora do contato com a erva daninha”, explica.
O especialista explica ainda que é impossível que o pesticida seja levado até rios, já que é absorvido de forma muito forte pelo solo e sua molécula não é volátil, o que significa que não pode ser transportado em forma de vapor para outros ambientes. “Além disso, os micro-organismos são responsáveis por degradá-lo. Sua máxima persistência no solo é de 15 a 45 dias”, informa.
Em geral, Cristofoleti afirma que, dentro das regras regulamentárias, o produto é seguro e pode e deve ser mantido até que seja substituído por nova tecnologia. “No passado, a falta de conhecimento, sobretudo de pequenos agricultores, resultavam em práticas perigosas. Ainda não estamos no nível ideal, mas a agricultura brasileira já evoluiu em nível de esclarecimento”, indica.
Resposta dos produtores de pesticidas
A redação entrou em contato com a Bayer e não houve resposta até o momento de publicação desta reportagem, mas, de acordo com declaração publicada no site da empresa, “mais de 800 estudos realizados mundialmente atestam a favor da segurança do glifosato. Esses estudos têm sido avaliados por diferentes órgãos, como a Agência de Proteção Ambiental (EPA), dos EUA, e a Comissão Europeia.
O texto ainda afirma que a conclusão destas e de outras agências reguladoras do mundo mostra que, quando utilizado de acordo com as recomendações técnicas e de registro, o uso do glifosato não apresenta riscos para a saúde humana ou animal, nem para o meio ambiente.
Por: Giulia Granchi
Do UOL VivaBem, em São Paulo
Fonte: André Murad,oncologista e professor da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais)
Angelo Zanaga Trapé, médico toxicologista e professor doutor aposentado da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas)
Pedro Cristofoleti, agrônomo e professor da USP (Universidade de São Paulo) — ESALQ (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz)
Transcrito: https://vivabem.uol.com.br/noticias/redacao/2019/02/20/agrotoxico-mais-usado-no-mundo-e-apontado-como-cangerigeno-por-novo-estudo.htm