A indústria de alimentos não quer matar você
Engenheira de alimentos reflete sobre os pilares e as novas atribuições das empresas que formulam e fabricam a nossa comida
Quando terminei a faculdade de Engenharia de Alimentos, há quase 20 anos, o foco da carreira era a segurança alimentar. O papel do profissional era buscar reproduzir, para a prateleira do supermercado, a deliciosa feijoada da casa da vovó com segurança — e garantindo a maior durabilidade possível. Nutrição era isso: consumir algo que faz parte da nossa cultura.
Mas parece que as coisas mudaram.
A mídia e as novas mídias (blogs, vlogs e redes sociais) têm dedicado muito do seu tempo falando sobre o “bem” e o “mal” quando se trata de alimentos industrializados — às vezes fazendo uso de termos e noções equivocados. Ao mesmo tempo, nunca se falou tanto em gastronomia e alimentação saudável. Cozinhar virou algo “cool” e, de repente, todo mundo virou especialista em nutrição.
Para começo de conversa, alimentos processados ou industrializados não são ruins.
Estudar ciência dos alimentos é divertido — e também uma delícia. O que aprendemos na faculdade nos capacita a atuar em diversas áreas da indústria. Alguns engenheiros optam por trabalhar no desenvolvimento de produtos. Outros, com garantia de qualidade. Alguns preferem fazer pesquisa em empresas ou universidades. Um grupo, por sua vez, se encaminha para a área regulatória e de relações governamentais, trabalhando em órgãos como a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) ou a FDA (entidade correspondente nos Estados Unidos), ou zelando em outras instâncias para que os produtos fabricados estejam em conformidade com as normas estabelecidas.
Somos os responsáveis por garantir que o alimento industrializado que chega aos consumidores seja seguro e de alta qualidade — sem deixar de ser gostoso! Sim, também está no nosso rol de funções desenvolver aromas e texturas deliciosas.
As pessoas em geral associam a expressão “alimentos processados” a refeições de micro-ondas ou fast food. Ou seja, tudo o que configura o junk food, comida calórica e da pior qualidade nutricional. Entretanto, a real definição de alimento processado é diferente: o termo significa simplesmente que um alimento sofreu uma modificação em alguma etapa do processo que o levará ao consumidor.
Quando uma cenoura é lavada e embalada, ela passa a ser alimento processado. Um suco de laranja sem conservantes, ao sofrer o processo térmico chamado pasteurização (essencial para aumentar sua segurança e tempo de prateleira), é alimento processado. Qualquer item que foi alterado pela indústria ganha essa nomenclatura. Até um tomate simplesmente embalado.
O processamento de alimentos é importantíssimo. Sem ele, não teríamos grãos selecionados, leite pasteurizado e produtos devidamente higienizados e embalados. Não teríamos, em essência, produtos seguros. É claro que precisamos reconhecer que nem todos os ingredientes presentes nos alimentos industrializados levam a benefícios à saúde. Isso não quer dizer, por outro lado, que façam mal. Tantas vezes, tudo depende da forma e da quantidade consumida.
Por:Dra. Tatiana Raposo Pires*
Transcrito::http://saude.abril.com.br/blog/com-a-palavra/a-industria-de-alimentos-nao-quer-matar-voce/